sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Amor em Carne e Osso

O amor. Faz um tempo que amor resolveu que precisava se materializar para ser aceito pelas pessoas. Ele então, que sempre fora abstrato, vestiu-se de carne; pôs ossos que sustentassem os músculos, cobriu-se de pele e pôs unhas, pêlos e cabelos. Ficou idêntico a nós. Você não veria distinção material nesse agente disfarçado. E certo dia de manhã, o amor nasceu humano. Agora o amor tinha mãos e pernas, andou entre nós e nos tocou. Muitos logo se alegraram com ele. Agora tão concreto, visível, tocável e, assim, tão amável. Mas as pessoas não gostaram quando o amor exigiu reciprocidade. Porque você sabe: o amor é exigente no quesito compromisso. Puxa, foi horrível. Mas as pessoas puxaram o amor pelos cabelos e bateram muito nele. O amor apanhava na cara. Foi humilhado. Foi acusado. Cuspiram nele. Traíram o amor. Mas as pessoas ataram suas mãos até que o penduraram numa Cruz. O amor sofreu, chorou, amou e por fim morreu de amor. Mataram o amor, menininha. Mas você sabe, o amor não morre; se transforma e amadurece. Morrer era parte do plano, você sabe. Agora eu também o amo, e descobri que sem sacrifício não há amor, querida. E é por isso que hoje eu morro um pouquinho por você; abdico alguns gostos, renego idiossincrasias e pessoalidades, cuspo fora meus egoísmos. Hoje eu morro um pouquinho por você, só pra dizer que eu também lhe amo porque Ele me amou primeiro.

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Plantio de Novelas e Romance de Batatas

Seja uma pessoa crítica, mas não uma pessoa crítica demais. As pessoas críticas demais são duras de se conviver e uma companhia do tipo mais desagradável, mesmo quando têm razão. Digo isso porque, na vida, há coisas mais importantes do que sempre ter razão e encontrar as falhas de todas as coisas. Observe a solidão delas e comprove. Se por um lado o senso crítico é uma potente ferramenta contra a alienação, por outro, o criticismo é alienador de quem o possui, ou melhor dizendo, de quem é possuído por ele.

É fenômeno comum de que as pessoas críticas demais são sempre críticas com relação aos outros, mas nunca sobre si mesmas. E é justamente por isso que são as mais alienadas. O senso crítico genuíno tem por natureza intrínseca ser crítico sobre aquilo que mais estamos familiarizados, e ninguém está mais familiarizado com outra coisa senão consigo mesmo. O escritor de romances será respeitado ao comentar a novela das oito, mas deve reconhecer sua ignorância sobre o plantio de batatas. Que o romancista critique novelas, e o agricultor analise batatas. Numa inversão de papéis, teríamos uma plantação de novelas e um romance sobre batatas? Ora, você convive consigo durante todo o tempo de sua existência, e deveria, portanto, ser o melhor e mais perito crítico sobre si mesmo no mundo. É por isso que ser crítico lhe conduz a humildade e ao desejo de ajudar os que são como você. Mas as pessoas críticas demais são especialistas em apontar as falhas dos outros, justamente por serem alienadas de si mesmas, e isso pelo forte criticismo que as possui. As pessoas críticas demais são vampíricas, não possuem reflexo. Em certo sentido elas não podem se ver, nem ao menos se conhecem. Querem que romances sobre batatas façam sucesso, alcancem altos índices de audiência. Coisa ridícula, eu sei. É ridículo ser crítico demais.


Seja uma pessoa crítica, especialista sobre os próprios defeitos, mas não uma pessoa crítica demais. Pessoas críticas demais são tão interessantes e realistas quanto romances sobre batatas.
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